terça-feira, março 18, 2025
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Venecianos na linha de frente do combate da Covid-19


Três profissionais da área da saúde contam o que vivem e sentem diante da pandemia do novo coronavírus. Aqui eles retratam um pouco da rotina de trabalho e o que mudou com o avanço da doença, incluindo, o preconceito sofrido nas ruas

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Um verdadeiro exército de profissionais vem se mobilizado para atender aos pacientes com sintomas do novo coronavírus, entre eles, três venecianos entrevistados pela A Notícia. O principal hospital do norte do Estado, que faz todo atendimento de ponta pelo Sistema único de Saúde (SUS), o Hospital Dr. Roberto Arnizaut Silvares (HRAS), conta com a fisioterapeuta Edileuza Gusson, a técnica de enfermagem, Efigênia Maria Cezário Coimbra, e o médico Edilson Moreira Maciel, que trabalham na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) do local. O HRAS atualmente possui três salas de Unidade de Tratamento Intensivo, sendo que, das duas existentes para os pacientes com COVID-19, uma, foi criada devido a pandemia. Já a terceira UTI, é destinada a pacientes com outras doenças. De acordo com muitos profissionais que estão à frente dessa pandemia, a tarefa é a mais difícil de suas carreiras, não é a toa que, as autoridades do País, deveriam pensar uma forma de gratificar as categorias da saúde, com a insalubridade maior. Na matéria, cada um do seu jeito, conta suas rotinas e visões sobre o momento atual.


Intubação

A ventilação artificial é invasiva para o Covid-19, é uma intubação que é feita com anestesia geral, que consiste em ficar cerca de três semanas sem se movimentar, com um tubo na boca, até a traqueia, e que permite ao paciente respirar ao ritmo da máquina em que está ligado. Por conta do incomodo e a dor, é necessário sedativo e analgésico, para garantir que o paciente fique o tempo necessário ligado a maquina. Em 20 dias em um paciente fica de tratamento, a perda muscular pode ser de 40% e a reabilitação pode durar até 12 meses, associados a traumatismo na boca e cordas vocais, com dor, isso se o tempo de internação não for maior e for necessário uma traqueostomia, é por isso que as pessoas idosos e frágeis geralmente não resistem. Outro detalhe é que enquanto o paciente está intubado ou não, dependendo do estado clínico, ele pode ser colocado em posição prona, ou seja, de bruços.


Intolerância. “Parei de usar branco, senti o preconceito nas ruas”

“No trajeto de casa até o hospital, eu vestia branco, tenho 15 anos de profissão, precisei eliminar isso da minha rotina, vou e volto de preto, agora. Já senti o preconceito pelas ruas, olhares, mudança de calçada ao suspeitarem que sou da área da saúde. Essa doença trouxe isso também. Estamos passando por um grande desafio. Isso gera apreensão, medo, angústia. Aqui, sabemos que essa é a nossa missão. É um trabalho constante, árduo e de toda equipe. O trabalho de todo mundo é importante. Meu trabalho é prestar os cuidados da enfermagem como em qualquer outro paciente, porém, com cautela. Uma coisa é fato, precisamos prestar o atendimento ao paciente, não descartando a possibilidade dele estar com Covid-19. Ele pode ter chegado ao hospital por ter sofrido um acidente automobilístico, mas pode estar contaminado pelo vírus e não ter apresentado nenhum sintoma. Isso tudo é muito cansativo, mexe com o psicológico, e os números de casos só aumentam. Eu nunca pensei em desistir, em ir embora e abandonar minha profissão, preciso honrar e trabalhar naquilo que escolhi. Mas os entraves que enfrentamos nessa pandemia é grande, os EPIs marcam nosso rosto no final do dia, e tem gente que não está levando a sério o momento. Eu tenho medo, quem não tem? Mas estou pronta em todos os dias do meu plantão, apara atender quem precisar”

» Efigênia Maria Cezário Coimbra, técnica de enfermagem de UTI

Desafio. “Somos responsáveis pelos tão disputados respiradores”

“O fisioterapeuta é um profissional essencial para a recuperação de pacientes com Covid-19, principalmente os mais graves. Somos responsáveis pelos tão disputados respiradores. Estamos trabalhando com algo novo, uma doença avassaladora, o perigo de contágio é grande para todos. Como estamos na linha de frente dessa pandemia, o contágio durante nosso trabalho tem sido alto. Na maioria das vezes, ocorre na hora de tirar os EPIs, é muita coisa. O fisioterapeuta intensivista tem entre as responsabilidades, realização da titulação (quantidade) de oxigênio que o paciente deve receber, aplicação de manobra toráxica, com intensão de aumentar a capacidade pulmonar do paciente. Nossas funções são muitas e bastante desafiadoras. Temos que avaliar o sistema respiratório, tem o monitoramento para identificar o momento em que o paciente pode precisar do equipamento, que vai o ajudara respirar. Na hora de intubação, auxiliamos os médicos e controlamos os respiradores mecânicos também. Nunca presenciei cenas como a que estou vendo agora, eu tenho 22 anos de profissão e jamais havia visto tantos pacientes sendo internados de uma só vez, com a mesma doença. É agonizante a dificuldade que eles apresentam ao tentar respirar diante de nós na UTI, sofremos também ao ver. Eu nunca vi algo tão feio e rápido para evoluir, o paciente está ali conversando, e daqui a pouco, tudo piora, é um desafio grande para todos os profissionais da saúde que estão trabalhando nesse momento. Por isso pedimos para a população se cuidar e seguir as orientações. As dificuldades dentro de um hospital nessa doença são grandes, é sofrido para o paciente, é difícil para família que nem visitar pode, então, previnam-se”

» Edileuza Gusson, fisioterapeuta de UTI

Preocupação. “Estamos lidando com uma doença nova, totalmente desconhecida”

“A pneumonia causada pela Covid-19 pode trazer casos graves de infecção, levando a óbito. Mas, tivemos um percentual de poucos pacientes com gravidade, e que foi ao óbito. Cerca de 94% de pacientes que deram entrada no Roberto Silvares, tiveram alta. Estamos aqui lidando com essa doença nova, que no fundo, ninguém sabe muita coisa sobre ela, esse é um dos problemas enfrentados também. Vejo que essa doença é seletiva, ela tem agido de forma severa com quem apresenta comorbidade, geralmente. Pacientes com diabetes, obesos doenças pulmonares estão nos dados de óbitos do Roberto Silvares, porém, tivemos cerca de sete mortes, nesse hospital que atende os casos do Covid-19 da região norte e noroeste do Estado. Mas também temos notícias boas quanto a isso. Tivemos um paciente obeso e hipertenso que precisou vir para nossa UTI, achei que ele não fosse sobreviver, mas a história teve final feliz, ele saiu da UTI, já está conversando e deve ter alta logo. Temos vários pontos a lidar com o Covid-19. Hoje a preocupação é se o paciente vai sobreviver ou não. Mas penso lá na frente, como vai ficar esse indivíduo, já que seu pulmão terá lesão, que transformar em uma fibrose e aí?. Poderemos ter um paciente com insuficiência respiratória, que terá apenas 50% do pulmão funcionando, ou menos. Essas complicações podem chegar ao infarto desses indivíduos, lá na frente teremos esse cenário. Um outro aspecto que também teremos que lidar, são os problemas psicológicos que essa doença vai nos trazer, as pessoas estão com medo, estão depressivas, é um fator preocupante também. Sobre a cloroquina, se o paciente for novo e não tiver comorbidade, a família assinando o termo, eu vou fazer a medicação nele. Já se ele tiver uma certa idade, ou em caso de outras doenças pré-existentes, é preciso fazer exames antes. Não há estudo que comprove a eficácia dessa medicação. Temos casos de profissionais aqui, que foram contaminados e se trataram em casa, e sem a cloroquina. Agora, se eu for contaminado e precisar usar a cloroquina, vou usar. Não tenho comorbidade, mas mesmo assim, farei exame antes do possível uso. Para finalizar, o que eu quero que as pessoas entendam é que, não podemos subestimar essa doença, porém, temos boas notícias também em relação a esse momento”

Edilson Moreira Maciel, médico intensivista (UTI) do Hospital Dr. Roberto Silvares
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