Com exibições até diárias, as obras na telona tiveram fim em 1998 na cidade, com Titanic. A sétima arte, que teve início na década de 50 por aqui, acendeu e apagou as luzes pela última vez, deixando saudade aos apaixonados pela magia que é, assistir tudo em grande dimensão. Cadeiras, som diferenciado e os efeitos que só quem aprecia cinema, já não fazem parte da vida de Nova Venécia há mais de 20 anos
A história dos três cinemas venecianos

Quem diria, o cinema já fez parte da vida cultural de Nova Venécia e fazia a diferença na cidade. Se hoje muitos moradores nunca estiveram em uma sala de cinema, há 70 anos atrás, era ali que a população se divertia.
Foi na década de 1950 que o primeiro cinema inaugurou aqui, em uma época em que a televisão nem havia chegado a Nova Venécia.
O primeiro local a exibir filmes na região foi o Cinema Alhambra, que inaugurou em uma modesta sala por volta de 1951, com assentos em bancões de madeira. O proprietário era seu Tito Cid Magalhães, o precursor dos filmes na telona no local.
Foi ali que tudo começou, inclusive com o cinema mudo, que também fez parte da programação. O fenômeno brasileiro, Mazzaropi, também tinham suas obras exibidas.
Instalado onde é hoje o estacionamento da Igreja Cristã Maranata (próximo a Academia Movimentação), seu Tito Cid, que era casado com Helena Barolo Magalhães, alugava o maquinário e os filmes em Colatina, do proprietário do Cine Alhambra de lá.
O Gordo e o Magro e outras produções em preto e branco eram as que tinham na época. A professora aposentada Maria Alice Toscano de Oliveira revela que sua mãe, Nancy Toscano de Oliveira, era uma das frequentadoras do lugar e que sempre narrava as apresentações assistidas lá.
O Alhambra contava com apenas 80 lugares e era a sensação da população na época. De acordo com os filhos do seu Cid, Alzira Rachel Magalhães Simões e Francisco Angelo Magalhães, as datas e horários de exibição dos filmes eram anunciados em um carro, que circulava pela cidade avisando. Três vezes por semana tinha sessão. “Eu era muito pequena e fui ao cinema com minha irmã. Ela teve que me levar embora antes de terminar o filme. Eu nunca tinha visto uma televisão e quando cheguei lá, aquela tela enorme, tinham um cavalos nas cenas que eu achava que iriam sair da tela e viria para cima de mim, fiquei aos prantos”, conta aos risos a aposentada Elida Salvador.
Dando início ao mundo cinematográfico da cidade, o Alhambra também exibia com frequência os filmes, A Deusa de Joba e Zorro, e funcionou por cerca de dois anos. “Mamãe fazia um doce chamado beijo frio, que era um picolé feito nas formas de gelo e era vendido na hora das sessões, o pessoal adorava”, diz Alzira Rachel.
O Cine do seu Grego
O segundo cinema de Nova Venécia foi o Cine Universal. Por volta de 1953, seu Manoel Caritos Papazanaki e a esposa, Leny Fundão Papazanaki, inauguraram o novo espaço. Seu Manoel era mais conhecido como seu Grego, apelido adquirido por ter vindo da Ilha de Greta, na Grécia, em 1912.
Com capacidade para 160 lugares, a estrutura funcionava em uma grande sala, que hoje corresponde ao espaço que inicia na Farmácia Santa Rita e vai até a Loja Opção, na Travessa Vitória. O primeiro filme exibido foi exibindo o filme o Ben-Hur, de William Wyler. “O cinema contava com um sistema de alto-falante, que era onde fazia-se a divulgação dos filmes”, diz a neta do seu Grego, Teresa Leny Papazanaki.
A bilheteria do Cine Universal, também conhecido como Cine do Seu Grego, ficava localizada justamente onde está a citada farmácia, e uma das funcionárias que vendia os ingressos para o filme ali, era a Claricia Farias dos Santos Rocha, 79, tia-avó do historiador Rogério Piva. No térreo do sobrado também funcionou a primeira sorveteria da cidade.
Para fazer o cinema funcionar, a máquina de projeção e os filmes eram adquiridos pelo seu Grego em Belo Horizonte. As sessões eram exibidas todos os dias a noite, e no domingo, duas sessões. Um sistema de auto-falante fazia a parte da divulgação dos filmes.
Seu Grego e dona Leny tiveram uma filha, a Angélica Papazanaki Ferreira, 88, primeira professora com formação de normalista do município, que mora em Vitória.




O Cine Universal de 850 lugares
O Cine Universal do seu Grego foi vendido para o casal, Paulo e Mariza Carvalho, que abriram uma nova sede do cinema em 1962, já na Avenida Vitória, em frente a Escadaria Jamille Daher. O cinema inaugurou com 850 lugare.
Um dos funcionários do Cine Universal foi o Osvaldo Castor de Melo, 50, mais conhecido como Cacici. Ainda aos 12 anos, em 1979, o menino começou a trabalhar na limpeza do local, e por lá ficou até encerrar o local.
Cacici conta que o cinema lotava e que quando o maquinista, o Mateus Alves de Oliveira, parou as atividades, seu Paulo Carvalho passou o ofício para ele. “Em 1982 comecei a exibir os filmes, era um trabalho espetacular”, conta.
Com exibições durante toda a semana, o Cine Universal veiculava três filmes diferentes entre os sete dias.
Antes de encerrar atividades, o cinema ficou por seis anos também, sob administração de Cacici. O fato se deu após a morte do proprietário do local. Por fim, em 1998, Titanic foi o último filme exibido. “O maquinário ficou ultrapassado, o espaço onde se encontrava o cinema foi diminuindo e dando lugar a outras atividades. O carvão mineral que era adicionado na máquina e servia de foco para projetar os filmes, foi ficando inviável de comprar, caro; era tudo importado”, diz Cacici.
Notório para quem presenciou a decadência do extinto cinema foi que, o público também foi se ausentando, a televisão começou a exibir filmes com frequência, o videocassete e as locadoras aumentaram a oferta domiciliar e, por vezes, chegavam às casas ainda antes das obras estrearem nos cinemas. “Acabar tudo foi triste. Era muito interessante. Para exibir, os filmes eram rodados em seis rolos por filme, em média. Duas máquinas se revezavam para o trabalho, quando acabava o rolo de uma, eu já havia trocado o da outra, e ali era dada a continuidade”, fala.
O Cine Universal, encerrou atividades com 350 lugares apenas, um número de cadeiras menor que o da metade de quando iniciou as atividades, na década de 1960. “A máquina que compramos do seu Grego foi aposentada depois de um tempo. Adquirimos mais duas novas, já que a antiga era preciso pegar os rolos pequenos de filme, colar as pontas e enrolar num rolo grande, para não precisar parar o filme a todo momento, no meio da sessão”, diz Marisa Carvalho.

Um Cine Teatro deu vida por aqui
O Cine Universal também já foi Cine Teatro Universal. Ali não eram veiculados somente filmes. A dança, a música e o teatro também fazia parte do local, desde a década de 60, até o fechamento.
Um festival de música na década em que o cinema foi inaugurado aconteceu, e a vitoriosa do festival foi a Sylnan Toscano, que interpretou a canção “Eu te amo mesmo assim”, da cantora Martinha.
Em 1984, no Cine Teatro Universal aconteceu a primeira oficina de teatro do local, trazida pelo empresário Matatias Soares (in memória). A partir daí, as encenações não pararam mais. O grupo de Teatro de Nova Venécia foi montado e a cidade sediou a 1ª Mostra Sudeste de Teatro, em 1995, trazendo atores e peças de São Paulo, Rio de Janeiro e outras localidades.
Também no final de 1995, o Cine Teatro foi palco do Encontro Latino Americano de Teatro, com peças além do Brasil, da Argentina, Chile, Peru e México.
Peças do Grupo de Teatro de Nova Venécia ganharam prêmios Brasil afora, com apresentações até no Uruguai.
Sob administração também do Grupo de Teatro Nova Venécia, o Cine Teatro Universal foi administrado de 1993 a 1998, época em que a prefeitura auxiliava nos custeios do local, e a proprietária, Marisa Carvalho, não cobrava nem o aluguel, tudo para que o Cine Teatro continuasse funcionando.
O servidor público Kiko Toscano acompanhou desde o início o teatro no município e fez parte dos elencos e direção de diversas peças venecianas, além de fazer parte do trabalho teatral dos festivais e outros eventos do ramo. Kiko viajou o Brasil com peças de teatro e foi um dos atores que esteve no Uruguai, fazendo parte do elenco da peça. Kiko ainda ganhou prêmio de melhor ator, no II Festival de Teatro Amador do Espírito Santo, realizado em Cachoeiro de Itapemirim, em 1985, com a peça, “O Santo Milagroso”, de Lauro Cezar Muniz, obra que também ficou em primeiro lugar por júri popular.
