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DR. ADALTON SANTOS (1919-1971): DE JUIZ DE DIREITO A PATRONO DE ESCOLA

Por Izabel Maria da Penha Piva* e Rogério Frigerio Piva**

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No dia 16 de Junho de 1984 era publicada no Diário Oficial a Lei Ordinária Estadual nº 3.639 de 07 de Junho que denominou de ”Escola de 1º Grau Dr ”Adalton Santos” a antiga Escola de 1º grau Nova Venécia (ex-Polivalente), situada no Município de Nova Venécia. A proposta, apresentada como Projeto de Lei nº 17/84 de 26 de Março daquele ano, era de autoria do deputado estadual Antônio Moreira. A partir da sua publicação, a tradicional escola veneciana ganhava um patrono que se destacou como Professor e Juiz de Direito. Além de nomear uma das mais tradicionais escolas venecianas, nosso saudoso Juiz nomeia uma “Rua Dr. Adalton Santos”, no bairro Niteroi em Castelo (ES), sua terra natal e a “Avenida Dr. Adalton Santos” no bairro de Itapoã em Vila Velha (ES), onde morou em seus últimos anos de vida.

Dr. Adalton Santos nasceu aos 16 de Junho de 1919, em Castelo, sul do Espírito Santo, no seio de uma família muito humilde de origem afro-brasileira. Seu pai Sr. Honório (Manoel Romão) Santos era braçal e sua mãe D. Amélia Maria (Quintina) da Penha Santos, lavadeira.
Desde muito cedo teve que ajudar a família nas despesas, tornando-se uma espécie de “pintor”, ou melhor, caiador de paredes. E assim começava sua vida com muito trabalho.

Iniciou seus estudos no Grupo Escolar Nestor Gomes, em Castelo, com o Curso Primário (atual Fundamental I) como então se dizia. Quanto ao Ginásio (o Fundamental II) só era alcançado com o Curso de Admissão (uma espécie de vestibular). Como Adalton era membro da Igreja Batista de Castelo, conseguiu por meio do Pastor José Francisco de Paula, que era coordenador de disciplina do Ginásio, a vaga de zelador do prédio. Nessa função é que foi flagrado pelo Diretor Técnico da instituição, Dr. Francisco de Menezes Pimentel Junior, Juiz da Comarca de Castelo, observando pelo corredor, atentamente e com interesse, as aulas de matemática do professor Donato Fauce.

O Diretor, após observar o interesse do jovem, o teria chamado: “Ó rapaz! Que está fazendo aí? Venha cá!”. Com muito receio de ser repreendido, nosso jovem Adalton, foi até ele recebendo a seguinte orientação, após esclarecer ao mesmo suas intenções com relação ao estudo: “Meu filho, levante-se mais cedo, cada dia, tome seu banho e assista às aulas com atenção.” Orientação que ele seguiu a risca. Mais tarde quando foram anunciados os proclamas do exame, logo fez sua inscrição. Não tardou sair o resultado e, entre a classificação geral, lá estava seu nome.

Ele enxergou os estudos como uma oportunidade única para “ascender” cultural, social e economicamente. Com muita competência, ainda estando no quinto ano do Ginásio, lecionava francês para as séries anteriores. Seu conhecimento deste idioma era aprimorado pela professora Maria Madalena Pimentel, esposa do Diretor. Quanto à língua inglesa, coube ao professor Dr. Deusdedit Baptista as lições que o tornaram trilíngue. E assim no Ginásio Municipal de Castelo (hoje EEEFM João Bley), além de formar-se no ginasial, tornou-se professor, sendo responsável pela fundação do Grêmio Literário Coelho Neto.

Mas não parou por aí. Foi para Vitória e em 1953, mesmo ano em que nos emancipávamos de São Mateus, Adalton Santos foi diplomado no curso de Ciências Jurídicas e Sociais da antiga Faculdade de Direito do Estado do Espírito Santo (que hoje integra a UFES). Advogou em Aimorés (MG) e Comarcas vizinhas. Na cidade mineira de Mutum foi Promotor de Justiça. A judicatura tornou-se então seu próximo objetivo. Com êxito, em 1958 tornou-se magistrado, sendo um dos primeiros, ou talvez o primeiro Juiz de Direito negro do Espírito Santo.

Mas em sua vida nem tudo era somente estudo e trabalho. Seus esportes preferidos eram Natação e Futebol, sendo seu coração rubro negro. Também foi tenor ou baixo no coral da Igreja Batista de Castelo, onde sua participação era destacada.

Apaixonou-se pela jovem Domícia Daniel de Lima, que trabalhava na casa do Diretor do Ginásio, o Sr. Francisco Menezes Pimentel Junior, como empregada. O interesse surgiu de suas visitas para as aulas de francês, sendo que deste casamento nasceram muitos filhos: Adalton Santos Filho, Ronaldo Santos, César Augusto, Samuel Fernando, Renato, Heloísa e Jussara.

Atuou como Juiz de Direito nas comarcas de Mucurici, Nova Venécia, Itaguaçu, Castelo, Barra de São Francisco, Afonso Cláudio, Alegre e Vila Velha.

Na Comarca de Nova Venécia, o Dr. Adalton Santos permaneceu de 1960 a 1964. Período este que aqui residiu com sua família na Avenida Vitória (onde hoje é a loja Mercadão Infantil). Nesta época o Fórum Ubaldo Ramalhete Maia funcionava em um sobrado próximo a agência do Banestes, diante do que hoje é a atual Praça do Imigrante. Aqui, além de juiz também foi professor lecionou Português e Francês e Literatura, no antigo Colégio Comboni e no Veneciano. Segundo Dona Élida Salvador Cellia, que foi sua aluna nos anos de 1960, 1961 e 1962 era “excelente professor, até bricalhão”. Ela chegou, inclusive, a estudar com o Adalton Santos Filho entre 1960 e 1961. Mais tarde, Dona Élida foi diretora na escola que aqui o homenageia.

Durante o período que atuou como Juiz de Direito em Nova Venécia, o Promotor Público era o Dr. Eduardo Durão Cunha, que ainda permaneceu nessa função até 1967. Neste ano (1967) o Dr. Adauto ainda voltou a Nova Venécia para ser o patrono das Normalistas (professoras) que se formaram na Escola Normal, tamanho era o carinho das alunas pelo seu professor. Mesmo após atingir o sonho de tornar-se juiz, manteve seu registro no MEC (atual Ministério da Educação) para lecionar Português, Inglês e Francês.
Mas esse juiz tinha o sonho de morar à beira de um rio com sua família, e por isso se estabeleceu em Itapoã, Vila Velha, onde construiu uma casa nas proximidades desse rio que hoje virou canal e é margeado pela avenida que leva seu nome.

Nosso querido Dr. Adalton Santos morreu em 1971, em São Paulo, onde estava tratando de sua saúde, debilitada pela diabetes e problemas de pressão arterial, aos cinquenta e dois anos. Foi sepultado em Vila Velha. A Escola Polivalente de Nova Venécia, que desde 1984 leva seu nome, só foi inaugurada em 1973, quando ele já havia falecido.

Em um velho jornal lemos as seguintes palavras a seu respeito e que, acreditamos, traduzem o sentimento de todos que o conheceram: “(…) quer como Juiz, quer como professor (ou em sua Igreja Batista, ou na Confraria Maçônica) era um cidadão respeitado, mercê de suas qualidades ímpares e bondade extraordinária.”

Que o Dr. Adalton Santos sirva de exemplo para todos que, como ele tem origem humilde e enfrentam limitações financeiras e o próprio racismo. Que não deixem os obstáculos da vida os impedir de alcançar seus sonhos. Salve, querido professor! Sua memória e exemplo de vida não serão esquecidos.

* Izabel Maria da Penha Piva é mestra em História pela UFES e professora de História na rede estadual em Nova Venécia.

* Rogério Frigerio Piva é graduado em História pela UFES, membro do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo (IHGES) e professor de História na rede municipal em Nova Venécia.

Referências:
Fontes Documentais:

· Livro 01 (Termos de Compromisso (Posse) dos funcionários e serventuários da Justiça da Comarca – 1956-1980) – Arquivo da Secretaria de Gestão do Foro – Fórum Dr. Ubaldo Ramalhete Maia – Comarca de Nova Venécia (ES).
· Livro 01 (Atas de Audiências Solenes – 1956-1999) – Arquivo da Secretaria de Gestão do Foro – Fórum Dr. Ubaldo Ramalhete Maia – Comarca de Nova Venécia (ES).
· Lei Ordinária Estadual n.º 3.639 de 07 de Junho de 1984. Denomina Escola de Primeiro Grau Dr. Adalton Santos situada no Município de Nova Venécia.(http://www3.al.es.gov.br/Arquivo/Documents/legislacao/html/LEI36391984.html) disponível em 11/03/2021.
· Relato via Whattsapp feito por Elida Salvador Cellia em 11/03/2021.
· Recortes de diversos jornais sobre o falecimento do Dr. Adalton Santos publicados na página do Facebook “DR. Adalton Santos” ( https://www.facebook.com/DR-Adalton-Santos-304570636330227/?ref=page_internal ) disponível em 11/03/2021.

Fontes Bibliográficas:
CINELLI, Nestor (Org.). ES – Nossa Gente. Vitória: Fundo Editorial do Espírito Santo, 1969, pp. 137 e 138.
OLIVEIRA, Hilma Valadares de. Folhetim do Colégio Pio XII – ano I – nº 12 – outubro de 2003.
SILVA, Irysson da. “Não importa o ninho se o ovo é de águia”. Revista do Instituto Histórico e Geográfico do Espírito Santo (IHGES). Vitória, Nº 45, pp. 81 a 88, 1995.

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